A Agricultura Sintrópica tem feito muito sucesso na Austrália. Embora os primeiros sistemas tenham sido implantados há pouco mais de um ano, existe um interesse muito grande nessa abordagem. Esse interesse vem acompanhado de muita discussão e comparações entre Agricultura Sintrópica e Permacultura. Nesse artigo compartilho algumas de minhas reflexões sobre essas discussões e comparações depois de algumas conversas em cursos e trabalhos por aqui.
Artigo escrito por Eurico Vianna, (Educador Físico, Sociólogo e Permacultor). Eurico e Osmany estão disponíveis para consultorias em Permacultura, Bioconstrução e Agricultura Sintrópica pelo email: fazendabelladf (arroba) gmail.com
A Agricultura Sintrópica compartilha muitos dos princípios que regem a maioria das outras abordagens regenerativas. Entretanto ela foi desenvolvida pelo geneticista e botânico Suiço Ernst Gotsch no Brasil sem nenhuma influência direta de outras abordagens ou sistemas de desenho. Muito embora muitas pessoas comparem a Agricultura Sintrópica com a Permacultura, elas são duas coisas diferentes. Ainda assim, isso não quer dizer que sejam mutuamente excludentes. Pelo contrário, ambas tem muito a ganhar com o intercâmbio inclusivo de conhecimentos e práticas.
Antes que possamos discutir as possíveis contribuições mutuas, vejamos algumas diferenças básicas de conceituação. A Agricultura Sintrópica é uma abordagem de Sistemas Agroflorestais (SAFs) que visa a produção de alimentos, madeira, fibra e medicamentos naturais de forma regenerativa. Ou seja, a Sintropia visa acumular recursos como água, fertilidade, biodiversidade e solo enquanto produz. Embora muito conhecimento empírico no que diz respeito ao posicionamento de um SAF em relação ao aspecto solar e à propriedade como um todo, por exemplo, tenha sido incorporado a Agricultura Sintrópica, isso se deu de maneira espontânea, sem que esses conhecimentos tenham sido sistematizados. De fato, a consideração maior tende sempre ser sobre o posicionamento das leiras em relação ao sol para maximizar fotossíntese.
A Permacultura, por outro lado é uma ciência de desenho que busca soluções permanentes para a moradia, alimentação, geração de energia, manejo de resíduos e captação de água. Para atingir seus objetivos de interdependência comunitária e resiliência e autossuficiência em cada propriedade a Permacultura faz uso, por exemplo, do princípio da localização relativa, onde cada elemento ou sistema tenha ligações de benefício mútuo com outros dentro do sistema como um todo. Além disso, a Permacultura se diferencia de quase todas as outras práticas porque também busca desenhar (projetar) as estruturas legais e econômicas necessárias para que os indivíduos envolvidos possam, de fato, criar uma agricultura e uma cultura permanente. Essa abordagem holística que une vários campos do conhecimento faz da Permacultura uma sistema interdisciplinar de desenho regenerativo, que pode e sempre que possível faz uso da melhor ferramenta para cada área que atua.
Em resumo, a Permacultura é uma metodologia de design regenerativo que engloba vários outros conhecimentos e práticas dentro de um sistema estruturado de desenho. A Agricultura Sintrópica é uma abordagem específica que foi criada para otimizar a produção de alimentos, fibras e madeira dentro dos sistemas agroflorestais. Isso significa que a Permacultura, que já faz uso de SAFs em seus designs pode fazer uso da Agricultura Sintrópica? Sim. E isso significa que produtores rurais e consultores na área de Agricultura Sintrópica não podem fazer uso da Permacultura como um sistema mais amplo de desenho que vai além do design do SAF em si? Não. Vejamos alguns contextos em que a ‘polinização cruzada’ desses campos pode trazer fertilidade para todos.
A Agricultura Sintrópica pode se beneficiar muito da análise de zonas e setores e do princípio da localização relativa oferecidos pela Permacultura. De fato, muitos SAFs tem sido implantados sem essa análise mais completa da propriedade como um todo e como os vários elementos e sistemas que a compõem podem economizar energia (em termos de trabalho, tempo e recursos). Permacultores, por outro lado, precisam estar alertas as mudanças contextuais que a Agricultura Sintrópica traz ao desenho da propriedade. Enquanto em uma visão clássica da Permacultura SAFs e pomares tendem a ser posicionados dentro das zonas 2 e 3, a Agricultura Sintrópica, por unir a horta com o SAF e produzir o alimento diário dos produtores, ‘pede’ um posicionamento mais aproximado, na zona 2 ou mesmo na 1.
Muitos designers com visão mais dogmática da Permacultura criticam o sistema linear da Sintropia. Mas por mais que o efeito de borda e o uso mais criativo da geometria possam aumentar muito a produção por área, de fato, não é prático para o pequeno produtor a colheita de um sistema muito diverso e ao mesmo tempo curvilíneo. A Sintropia, por outro lado, e talvez por uma herança do pragmatismo suíço, desmerece um conjunto de soluções e práticas permaculturais que já foram consagradas em outros países por vários empreendedores da agricultura regenerativa. Por exemplo o cultivo de leiras de SAFs ou sistemas silvopastoris harmozinados em curva de nível ou em Linha Chave. Essas abordagens são largamente usadas para melhorar a hidrologia do terreno, ou seja, para melhor distribuir a maneira como a água percola pelo terreno otimizando a irrigação passiva enquanto também evita os processos de erosão causados pelas águas de enxurrada.
Em suma, tanto os floresteiros Sintrópicos como os designers precisam estar mais abertos a essa troca que pode, e deve, ocorrer entre esses dois campos do design regenerativo.